Wednesday, December 19, 2007

Karlheinz Stockhausen

Não é preciso ser-se um erudito em história contemporânea para se saber que a música electrónica surgiu, há muitos anos (anos 50 e 60) e no caso da música concreta até antes (40 e 50)! Muito antes da música ''popular'' que se houve hoje por aí com as mais diversas denominações comerciais (transe, drum, drum & bass, electro, electro-clash...etc, etc...). Sem querer questionar o valor artístico destes géneros músicas, noto muitas vezes que arrogantemente e de forma ignorante há pessoas que julgam estar a viver um momento de pura modernidade. Na verdade o que se deu foi a popularização da música electrónica, nas suas formas mais simples, ajudada em muito pela banalização dos meios de composição e de gravação que, na altura dos pioneiros da música electrónica e electro-acústica eram complicadas máquinas de laboratório hoje estão disponíveis em qualquer pc barato. Karlheiz Stockhausen, um homem extremamente corajoso, de génio irrequieto, polémico e muitas vezes megalómano e que teve a coragem e a lucidez de se aventurar pelo inexplorado e ostracizado mundo da musica contemporânea numa das suas formas mais extremas, morreu aos 79 no dia 5 de Dezembro. Deixa-nos um legado do século XXV, o qual será certamente objecto de estudo nas próximas dezenas, senão centenas de anos.

Uma das obras mais extremas e absolutamente revolucionárias que ouvi foi o quarteto de cordas com helicópteros (Helikopter-Streichquartett) (que é tocado com estes instrumentos mesmo: um quarteto de cordas e quatro helicópteros)! Além desta magnifica composição, claramente fruto de um génio superior recomendo o ''Kontakte'' e ''Gruppen'', as quais certamente serão de fácil acesso para os meus leitores internautas.



Biografia:
http://en.wikipedia.org/wiki/Karlheinz_Stockhausen

Kontakte:
http://br.youtube.com/watch?v=K0h0ApJAeSg

Helicopter String Quartet:


http://br.youtube.com/watch?v=13D1YY_BvWU

Monday, December 17, 2007

C de Pablo Neruda

Há dias a trás uma conversa de tema inesperado com C. , abriu caminho para um agradável regresso ás memórias do meu passado, e em particular ao momento em que descobri a poesia de Pablo Neruda. Hoje passados alguns anos ainda são poucos os poemas de outros autores que me conseguem comover, como os dele. A verdade é que lê-lo estimula-me emocionalmente da primeira á última letra, e considero alguns dos poemas como o que mostro a seguir sínteses admiráveis de momentos inesquecíveis os quais se tornam ainda mais belos recordados ao som das palavras de Neruda.

O teu riso
Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.
Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.
À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosada minha pátria sonora.
Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.
Pablo Neruda

http://en.wikipedia.org/wiki/Pablo_Neruda

Sunday, September 30, 2007

A ciência e o galo de Barcelos


É conhecida a aversão portuguesa á ciência, á matemática...enfim no limite a tudo o que obrigue a fazer raciocínios mais elaborados, do que contar os dias que faltam até ao próximo jogo do Benfica, quanto tempo falta até ao 13 de Maio ou quantos meses se têm que privar de uma vida decente até poderem comprar um carro igual ao do vizinho.
Uma das consequências deste imenso atraso civilizacional, é o facto de em Portugal os cientistas serem olhados como pessoas que estudaram muito, mas que desperdiçaram o seu conhecimento e inteligência na ciência em vez de optarem por um ''emprego'' normal.
Aliás a maioria dos portugueses até chega ao cúmulo de achar que ser cientista não é uma profissão, que não servem para nada e que apenas usam o dinheiro dos contribuintes para seu deleite intelectual. Assim pensa a maioria do povo e quase a totalidade dos governantes, os quais em geral não percebem nada de ciência, ou de tecnologia ou de outra coisa qualquer, que vá para além do Direito e Finanças... aliás, ás vezes pergunto-me: ''Como é que é possível um país ser governado (quase) exclusivamente por licenciados em Direito?'', a representatividade das outras profissões é nula, e a falta de sensibilidade para questões que não dependam de artigos, do código do processo civil e de outras tantas coisas absolutamente entediantes como as que referi, contribui para a imensa viscosidade em que o progresso cultural português está imerso.
Para o aspirante a cientista em Portugal há muito poucas soluções...uma vez que como ninguém o vê como trabalhador, ninguém lhe vai dar emprego!
Então há um sistema de bolsas, bolsas de investigação, bolsas de doutoramento, bolsa de pós doutoramento... e outras. Quem quer fazer ciência aqui, tem que saltar de bolsa em bolsa e sujeitar-se muitas vezes a interregnos mais ou menos prolongados, sem direito a qualquer apoio, pois é-se ''bolseiro'' e não ''trabalhador''. O próprio nome ''bolsa'' a mim, e quase toda a gente remete para um sistema de apoio social, para desfavorecidos... e é de facto essa a imagem do cientista português perante a sociedade um ''nerd'' a quem o estado garante por vezes umas bolsas, sem as mais básicas regalias... muitas vezes até aos 40 anos...
Do meu ponto de vista, o bolseiro de investigação (licenciado, mestrado, doutorado ou pós doutorado), é um trabalhador...Terá que haver contratos de trabalho, para investigadores e ponto final. Como os investigadores fazem formação continua....não há ambiguidade nenhuma, faz parte do seu trabalho fazer formação continua...
Só uma mudança de paradigma poderá fazer um inversão das mentalidades e criar uma base sustentável para o futuro da ciência portuguesa. Outros estratagemas políticos que não apontem nesta direcção, que não prevêem um estatuto do trabalhador cientifico, com todos os direitos constitucionais a que um trabalhador tem direito, impedirá Portugal de ter um corpo cientifico motivado, fomentará o ''brain drain'' para países civilizados, com gente civilizada, que os recebe de braços abertos e lhes dá claro está, condições laborais decentes. Esses países, agradecem!!!
Outros desistem...e vão trabalhar no Continente, no MacDonalds...dão umas explicações e contribuem para a massa de gente frustada deste já cinzento e triste país...

Friday, August 31, 2007

(Pseudo)Ciência Jornalística

Há já muito tempo, que constatei que os jornais generalístas de maior tiragem deste país (e os outros também) fazem artigos sobre ciência que são apenas a constatação de factos ou relatos absolutamente superficiais de um ou outro fenómeno/descoberta mais espectacular. Na verdade raramente descobertas científicas relevantes aparecem neste tipo de jornais. Por outro lado a descoberta de água em Marte (acontece uma vez por semana) e a descoberta para a cura do cancro e da SIDA (acontece todos os dias), são tratados de forma exaustiva!
Poucas vezes, nestes jornais encontrei um assunto tratado por alguém cuja arte da divulgação científica seja reconhecida. Em geral as noticias são todas iguais, não passam de um copy-paste traduzido, que dá a volta ao mundo de jornal em jornal, de agência noticiosa em agência noticiosa, não havendo o mínimo de esforço para enquadrar o artigo no contexto socio-cultural do leitor e em muitos casos para o traduzir correctamente.
Não é de admirar portanto que ninguém se interesse por ciência pois aquilo a que os mass media chamam de ciência de facto não é ciência!
A ciência baseia-se no porquê, e não na mera observação passiva dos fenómenos. Um artigo num jornal generalista, quando bem feito pode conter ciência, intelegível por todos e acima de tudo ser cativante e motivar as pessoas para o conhecimento científico.
FACTOS CONCRETOS
Ex. www.Google.pt
Cliquem nas Notícias
Se repararem no lado esquerdo existe um menu, cliquem no campo Ciência:
1ª Notícia científica: Exposição bio-bibliográfica «Trajectórias», sobre o Comandante Sarmento de Beires
2ª Notícia científica: Mais polícias municipais discutidos quarta-feira
3ª Notícia cientifica: Steve Jobs bate com a portana cada da NBC
4ª Notícia cientifica: NASA detecta água em sistema planetário em formação
Ah! finalmente uma notícia com contéudo cientifico!!! NASA, planetas e água...combinação perfeita...ou não.Vejamos, a noticia é do PUBLICO e se se derem ao trabalho de a ler verão que não tem grande interesse para além das siglas estranhas que os jornalistas gostam de usar para adornar as suas colunas cientificas e poderem dar um certo ar de erudição. Se lerem ainda com mais cuidado verão que não há uma única pista de como se detectou água nesse sistema planetário...!!!
A ciência em Portugal precisa de se livrar do tratamente de que é alvo nos mass media. Essa é uma responsabilidade que acima de tudo os cientistas têm que tomar como sua.

Saturday, August 04, 2007

LUX AETERNA


György Sándor Ligeti (1923–2006). Quando me cruzei com a obra de György Ligeti (GL), já lá vão uns anos, a minha perspectiva da música ganhou uma dimensão extra. Foi um ponto de viragem nas minhas concepções musicais, que até então estavam enraizadas nos métodos clássicos de composição e interpretação. Foi a minha porta de entrada para o fantástico mundo da ''música contemporânea''.
A minha fascinação pela obra de GL é ainda hoje imensa, e não diminuiu em nada à medida que fui, naturalmente, conhecendo outros compositores e à medida que o meu entendimento da música contemporânea se tornou maior. Uma das facetas que me seduz é o facto de ele não ter sido um apóstata da musica classica, mas ter construído uma obra bem assente sobre as estruturas clássicas, mas ter criado uma obra musicalmente radical e sem dúvida alguma ter encontrado uma outra via nos já superexplorados métodos tradicionais de interpretação e composição. O fascinio por GL, tornou-se lendário na pessoa de Stanley Kubrick, que a partir de determinado momento incluiu inúmeras obras nos seus filmes, tornando-se assim, um dos seus maiores divulgadores. Veja-se por exemplo ''2001 odisseia no espaço'' que conta com uma série de momentos musicais das obras de GL, em tal simbiose que muitas vezes chego a pensar se parte do filme não terá sido criado para a música.

Obras que destaco:
-Requiem for Soprano, Mezzo-Soprano, 2 Mixed Choirs & Orchestra
-Le grand macabre (ópera)
-Apparitions
-Atmosphères
-Lux Aeterna
Deixo aqui um link para uma interpretação fantástica do '' estudo nº13, Devil's staircase''.

Sunday, July 15, 2007

ROOM 101

“To the future or to the past, to a time when thought is free, when men are different from one another and do not live alone – to a time when truth exists and what is done cannot be undone:From the age of uniformity, from the age of solitude, from the age of Big Brother, from the age of doublethink – Greetings!”

Nunca mais olhei para a sociedade depois de ter lido o 1984...fiquei de tal forma fascinado com o livro que o li várias vezes tanto na edição portuguesa como na versão original, a qual comprei há alguns tempo atrás e voltei a ler.
A densidade da distopia orwelliana é de tal ordem grande e fascinante que não me importo de por vezes voltar á Eurásia para rever o mundo, sem a opacidade retinal em que o dia a dia nos coloca. Ao ler este romance perdi a inocência para sempre...levantou-se uma cortina que nunca mais irá baixar. Fiquei portanto condenado a aguentar o espectáculo da vida como ela é até ao fim dos meus dias.
Todos nós temos um pouco de Wiston Smith ou de Julia...e todos nós, como eles, tememos os nossos pesadelos..todos nós receamos passar um dia pelo medonho ''Room 101''. No livro Orwell sugere que Wiston conseguiu livrar-se das torturas infligidas por O'brien traindo a Julia e tudo indica que o mesmo lhe aconteceu a ela.
No ministério do Amor (MiniLuv em ''newspeak'') responsável pela manutenção do amor e da lealdade dos habitantes ao partido IngSoc e a sua submissão ao Big Brother, através da lavagem cerebral e torturas permanentes, O'brien pretende simplesmente fazer com que Winston traia Julia, se submeta absolutamente ao partido e à ordem vigente...mas também que se abandone...e se torne incapaz de resistir ou de duvidar.
Um dos aspectos poucas vezes referidos, é a que a redução ao mínimo das relações sociais imposta pelo IngSoc, com isto pretende evitar o pensamento colectivo. No limite, o controlo da sociedade passa a ser reduzido ao controlo do individuo.
O aumentando do ''atomismo'' social a que tenho assistido, na nossa sociedade ultra-individualista, assusta-me, pois estamos a ficar cada vez mais sós, prozáticos, deprimidos e incapazes de nos entre-ajudarmos, mesmo nas coisas mais simples.
Nunca estivemos tão sós e jamais voltaremos a estar tão unidos.

Sobre o 1984 há imensa coisa escrita. Para os interessados está na wikipedia um dos melhores artigos que jamais lá encontrei, o que demonstra com clareza o fascínio que esta obra tem sobre as pessoas.

A obra completa de George Orwell pode ser encontrada em:

http://www.george-orwell.org/

Uma vista de olhos no filme ''Nineteen Eighty-Four '' (1984) , pode ser dada através de:

http://www.youtube.com/watch?v=J7Kznmrc3o4

Outras obras que li baseadas em ambientes distópicos e de que gostei muito:


''Admirável mundo novo'', Aldous huxley
''Nós'', Yevgeny Zamyatin
''Farenheit 451'', Ray Bradbury
''Triunfo dos Porcos'', George Orwell
''Laranja Mecânica'', Anthony Burgess

Wednesday, July 11, 2007

O que pode provocar um levantar de cama menos atento, ou a importância de um intervalo de tempo infinitesimal em toda a nossa vida.


É muito fácil encontrar padrões de comportamento, tanto nas nossas vidas como nas dos outros. A ordem de que falo pode não ser absoluta, regra geral é local tanto no espaço como no tempo.
De facto o que mais me fascina perante esta constatação é a importância das singularidades no conjunto de padrões aparentemente monótonos. Por singularidade quero dizer um evento não previsto, um acaso. E, o que é mais interessante ainda, é facto do poder do evento que ocorreu, digamos numa fracção infinitesimal de tempo ser regra geral absolutamente menosprezado quando de facto poderá ter o poder de mudar para sempre o rumo das nossas vidas.
Repare-se na extrema instabilidade do equilíbrio em que assenta o nosso dia-a-dia...a dramática importância que o acaso tem nas nossas existência. Podemos prever quase tudo, mas nunca prevemos o acaso. O acaso é o móbil que atira o equilibro instável em que estamos para dinâmicas vertiginosamente imprevisíveis que podem catalizar acontecimentos que se repercutirãomuitas vezes até ao final das nossas vidas.
A probabilidade do ''acaso'' acontecer está intimamente ligada ao número de variáveis que descrevem o sistema, em geral quanto maior o número de variáveis presentes, maior a probabilidade de ocorrem ''acasos''. É essa dependência sensível das condições inicias, ou do valor das variáveis iniciais que pode tornar um intervalo de tempo infinitesimal, a duração de um sorriso, um olhar, um momento fatal de distracção, muito mais importante do que os períodos que o antecederam e eventualmente os que o sucederam. A dependência sensível das condições iniciais, é o que popularmente ficou conhecido por ''efeito borboleta''. Este tema foi objecto de estudo de Eduard Lorenz e está brilhantemente resumido na frase emblemática: ''Does the flap of a butterfly’s wings in Brazil set off a tornado in Texas ''.
A vida de um ser humano é sem dúvida alguma um sistema dinâmico de muitíssimas variáveis, como sejam a sua fisiologia, a sua mente e ás infindáveis variáveis do meio em que ele vive. A vida é portanto um destes sistemas que descrevi, um sistema muito sensível das condições iniciais, que numa fracção de segundo faz com que se acabe a monotonia dos dias ou mesmo com os nossos próprios dias!
E o que pode provocar um levantar de cama menos atento? Bom, se leram e compreenderam bem o que eu disse, já devem saber que a resposta é simplesmente: TUDO!


Atractor estranho de Lorenz a 3 dimensões








Monday, July 09, 2007

MORITVRI.TE.SALVTANT

Segundo Suetonius, Claudius 21.6, as sangrentas lutas de gladiadores eram por vezes precedidas de um ritual, no qual estes se dirigiam ao Imperador e diziam: ''Moritvri.Te.Salvtant''. Esta imagem da Roma antiga é a minha metáfora do presente. Olho para a vida frequentemente com a ilusão de estar olhar da perspectiva do imperador, mas sei que me encontro muito mais frequentemente na arena, em batalhas titânicaa sem vencedores, mas de vencidos.

''Uri, Vinciri, Verberari, Ferroque Necari'', Petronius Satyricon 117

Jean-Léon Gérôme (França, 1824-1904), Pollice Verso (dedos para baixo), 1872, óleo sobre tela